No artigo anterior, falamos sobre o ciúme, suas possíveis causas e consequências.
Existe uma construção social de que: “Quem ama cuida!” e esse “cuidado” muitas vezes é demonstrado como forma de ciúme. Não, isso não é amor! Ciúmes exagerado, controle e possessividade não são demonstrações de amor ou cuidado, são expressões de insegurança, carência e fragilidade emocional.
O amor verdadeiro alegra-se ao ver seu amado livre, sem amarras. O outro fica na relação porque a companhia é saudável, a troca é equilibrada e estar com seu amor lhe permite ser quem se é.
É insustentável estar em companhias onde não se pode ser VOCÊ mesmo. Ou estar ao lado de cobradores (já pensou uma pessoa na sua porta te cobrando todos os dias?) Assim é o ciumento, um cobrador que por vezes cobra boletos que não devemos com juros abusivos em forma de interrogatório.
Pelo outro lado, também é insustentável conviver com pensamentos recorrentes de traição, sentimentos de insegurança, não conseguir confiar em si mesmo e no outro, caminhar com a necessidade de validação e comprovação do amor e da fidelidade.
Quem se ama igualmente se respeita, respeita sua individualidade e o direito de ser quem é, vestir o que gosta, fazer o que ama, claro, respeitando a si mesmo e a relação, sem excessos de concessões que lhe custem a paz e a saúde mental.
Em relações onde o espaço de cada um é respeitado, o amor floresce.
Nas relações onde a troca entre dar e receber é equilibrada (um não faz demais para depois poder ficar cobrando do outro o que fez) onde existe a comunhão das partilhas, a identidade do casal vai sendo construída em alicerces saudáveis, sem sufocar ou constranger, as raízes podem ficar mais profundas, buscando no amor mútuo e na confiança a força necessária para a árvore do relacionamento crescer e frutificar!
Encerro com o texto ‘Ciúme’ do querido Rubem Alves (inclusive deixo a indicação de um dos seus livros maravilhosos sobre o tema ciúme: A menina e o pássaro encantado)
“Ela tinha a beleza tranquila da maturidade.
Alguns fios de cabelo branco davam ao seu rosto um encanto especial.
De hábitos domésticos e simples, um de seus prazeres era assentar-se numa poltrona e entrar na bolha que a leitura cria.
Quem lê está num outro mundo, muito distante.
O marido a observava de longe. Olhos que observam são aqueles que olham quando o outro não está olhando. Seu olhar era o de apaixonado que desconfia, olhar de ciúme. Os olhos do ciumento vigiam.
Vigiam gestos, movimentos, horas, sorrisos.
Vigiam porque as modulações silenciosas e distraídas da pessoa amada podem conter revelações sobre aquilo que ela esta pensando.
O ciumento suspeita que o ser amado lhe esconda alguma coisa.
Olha na esperança de ver algo escondido, de entrar dentro do segredo do outro. O ciumento detesta os pensamentos.
Por mais que os vigie, eles estão além de sua vigilância.
Ele queria adivinhar seus pensamentos.
E a sua vigilância se exacerbava quando ela sorria ou ria.
Como explicar este sorriso se ele, o marido, não estava dentro do livro?
Ela não precisava dele pra ser feliz.
Porque ali, mergulhada no livro, o marido não existia…”
“O ciúme nasce quando se toma consciência de que a pessoa amada é livre. Ela é um pássaro pousado no ombro.
Nada o prende. Pode voar quando quiser.”
Fonte: Débora Clais