Saúde Emocional em Tempos Difíceis


Saúde Emocional em Tempos Difíceis

Atualmente estamos passando por tempos difíceis e nossa saúde emocional pode pagar um alto preço durante essa passagem, acredite, tudo passa. É com olhar profilático e amoroso que escrevo essas linhas com objetivo de orientar e auxiliar sobre os cuidados com a saúde emocional.

Você já ouviu falar sobre a Terapia Focada na Compaixão?

É uma abordagem desenvolvida pelo psicólogo Paul Gilbert, a Terapia Focada na Compaixão surgiu da observação de como muitas pessoas tratam a si mesmas de uma maneira muito dura, como se existisse um General dentro delas, o tempo todo ordenando, criticando, cobrando e desprezando.

Nesse sentido, o objetivo dessa Terapia é possibilitar a elaboração de uma atitude mais compassiva consigo, desenvolver uma voz interior calorosa e amorosa. Assim como falamos com carinho com um amigo, podemos mudar o tom do auto-diálogo e passar a conversar com um tom de voz mais ameno nesse interminável diálogo interno.

Nas ultimas três décadas, a ciência, a filosofia e a espiritualidade uniram-se, dando lugar de destaque à compaixão como um valioso remédio ao sofrimento. Em tempos de pandemia, vicejou o interesse sobre o tema. Ser compassivo é ser tocado pelo sofrimento, seja seu ou do outro, e ter o comprometimento de aliviá-lo e preveni-lo. Mas...Auxiliar no sofrimento não é tão simples. É necessário entender a raiz, a função do problema para que possamos encontrar soluções efetivas. Então, se queremos aliviar nosso sofrimento, o primeiro passo é tomar consciência do problema.

Pensamentos circulares

Nosso pensamento nos transporta para o futuro constantemente, em especial neste momento de pandemia, nessa viagem, ficamos preocupados e temerosos com o contágio, as doenças, a economia, com a despedida de quem amamos e a nossa própria despedida. Esses pensamentos e preocupações trazem sentimentos de medo, tristeza, raiva e ansiedade que são características de um sistema neurofisiológico comum, o sistema de ameaça. Nele, a nossa atenção se volta para o perigo, para que possamos nos defender a partir de luta ou fuga.

Por exemplo, se você estiver de frente com um cachorro bravo ou uma cobra venenosa, é mais vantajoso ficar atento ao animal em vez de pensar no cliente que você precisa atender no próximo mês. Mas quando falamos de preocupações que não se resolvem do dia para a noite, ficar obcecado com o problema é altamente prejudicial.

Quando ativamos no nosso cérebro o sistema de ameaça, não conseguimos raciocinar direito. Assumimos a postura defensiva e prejudicamos a nossa saúde física e mental. Independente da ameaça ser imaginária ou real, ela atua como um imã atraindo a atenção o tempo todo. Topa fazer um teste? Feche os olhos e imagine um limão, observe sua casca verde, você corta lentamente o limão em duas metades e pequenas gotículas azedinhas saltam da fruta enquanto a faca o divide. Então, conseguiu mentalizar? A boca saliva porque o nosso cérebro responde a essa mentalização da mesma forma que ele responde ao limão sendo cortado de fato. Ou seja, o medo de contrair a doença ou de estar com a doença, aciona o mesmo circuito neurofisiológico. Quando nos sentimos ameaçados ficamos obcecados com a ideia que nos assusta e supervalorizamos informações que confirmem as nossas preocupações. O sistema de ameaça estimula pensamentos, conversas e consumo de informação que retroalimentam o próprio sistema de ameaça, em um pensamento circular onde o desespero gera mais desespero.

Trabalhando com a autocompaixão

Para aplicar a compaixão, primeiro precisamos entender como ela atua na nossa fisiologia. Os seres humanos têm o desejo inato de aliviar o sofrimento. E esta motivação nos leva a comportamentos de cuidado com o outro e com nós mesmos. Quando somos cuidados, nos sentimos calmos e seguros. Ainda que o consolo do outro não resolva o problema, o conforto de sentir-se compreendido tira um peso das costas. Isso acontece porque sentir-se apoiado ativa o sistema neurofisiológico de afiliação e tranquilidade.

A frequência cardíaca diminui e há uma produção de ocitocina que neutraliza o sistema de ameaça. Equilibramos o sistema de ameaça não lutando contra ele, mas ativando o sistema contrário a ele. De fato, a base da autocompaixão é funcionarmos como melhores amigos para nós mesmos, estimulando o nosso sistema de tranquilidade e afiliação sempre que necessário.

Equilibrando o Sistema de Ameaça

Ninguém escolhe entrar em pânico, é natural que estejamos apreensivos, mas é nossa responsabilidade, como adultos, entender como funcionamos e regular nossas emoções, que é possível quando estimulamos nosso sistema de afiliação a partir do autocuidado. Abaixo estão algumas sugestões com embasamento cientifico que podem auxiliar:

  1. Pratique a pausa da autocompaixão: Kristin Neff, pesquisadora referência no tema, operacionalizou autocompaixão com três elementos: mindfulness (atenção plena), humanidade comum (consciência das experiências inerentes aos seres humanos) e autogentileza. Em momentos dificeis faça uma pausa, e passe mentalmente por cada um deles. Primeiro investigue sua experiência com mindfulness, ou seja, traga-se para o presente e acolha o sentimento. Segundo, lembre-se da sua humanidade e do entendimento que o sofrimento é inerente à condição humana. Se você está nervoso, triste ou ansioso, não significa que tenha algo de errado com você. Esses sentimentos são naturais. Quando você entende que as suas dificuldades são parte da experiência comum, e não provas de incompetência ou fraqueza, fica mais fácil acolher o que você sente com o terceiro elemento da autocompaixão, a autogentileza.
  2. Valide seus sentimentos: Você já notou que tendemos a nos abrir com quem compreende o que sentimos? Sentimos segurança quando o outro reconhece o que se passa dentro de nós. Quando você oferece compreensão a si mesmo, você estimula sentimentos de segurança que neutralizam o sistema de ameaça.
  3. Respiração e toque: Os pensamentos são capazes de afetar o corpo, por exemplo: produzindo taquicardia quando estamos ansiosos. Portanto em vez de usar os pensamentos para ficar mais calmo, use o corpo para acalmar a mente. Uma das formas de fazer isso, é desenvolver o hábito de respirar profundamente por três minutos algumas vezes durante o dia. Lembre-se de fazer expirações tão ou mais longas que a inspiração, isso é importante para ativar o sistema nervoso parassimpático. Enquanto respira, você pode colocar as mãos sobre o coração isso comunica segurança para o cérebro, experimente!
  4. Fale com você como Fala com seu amigo querido: É mais fácil termos clareza, gentileza e sabedoria quando apoiamos o outro do que quando refletimos sobre os nossos próprios problemas. Então, pense sobre como você encorajaria ou apoiaria um amigo na mesma situação. E fale com você da mesma forma. Fale consigo usando o seu nome em segunda ou terceira pessoa. Evidências científicas demonstram que, quando falamos com nós mesmos como se fossemos outra pessoa, somos mais capazes de lidar com situações emocionalmente desafiadoras e agir com mais sabedoria. Isso acontece porque a distância emocional estabelecida pela linguagem permite regular melhor o sistema de alarme.
  5. Notícias e Redes Sociais: Lembre-se que quando estamos no sistema de alarme, tendemos a consumir informações que alimentam o nosso medo, raiva e tristeza. Limite o tempo e selecione o que faz bem para você neste momento. Se possível, deixe de seguir conteúdos que prejudiquem seu estado emocional.
  6. Tenha um Kit Compassivo: O uso dos nossos sentidos são poderosos ativadores emocionais que podem te ajudar a estimular o sistema afiliativo. Podem fazer parte do seu kit objetos que lembrem a experiência de cuidado e segurança, como por exemplo: Fotos de bons momentos, um óleo essencial com cheiro tranquilizador, uma música calma e tranquila...
  7. Meditação: Não basta entender a autocompaixão. Precisamos nos importar conosco. Cuidar com carinho do ser humano que encontramos no espelho. Como tudo na vida, ficamos melhores naquilo que praticamos. Exercitar a autocompaixão por meio da meditação ajuda a tornar a autocompaixão mais intuitiva nos momentos de dificuldade.
  8. Carta de Amor: Outra técnica consiste em escrever uma carta compassiva para si mesmo. Ao escrever uma carta para você, como se como escreveria uma carta para uma pessoa querida que estivesse sofrendo algo parecido, sabemos que, ao escrever, colocamos para o papel o que antes estava em nossas mentes, podendo nos proporcionar um alivio e melhor clareza para refletir sobre as preocupações e sentimentos.

Para finalizar, deixo uma frase de Kristin Neff

“O sofrimento faz parte da vida. Que eu seja gentil comigo mesma neste momento. Que eu possa dar a mim mesma a compaixão de que preciso.”

 

 

Fonte: Débora Clais